Vitória, Francisco de (1492-1546)
Teólogo e filósofo de direito, esse frade dominicano nasceu em Burgos e morreu em Salamanca. Estudou em Paris e foi professor de teologia nessa mesma universidade (1516-1522). Regente catedrático no estudo de São Gregório de Valladolid (1523-1525), ocupou a primeira cátedra de teologia da Universidade de Salamanca de 1526 até a sua morte. Vitória foi, antes de mais nada, um professor e um orador brilhante, que tratou de problemas de atualidade com grande independência de juízo e soube unir o rigor do método escolástico à elegância humanística da exposição.
Sua obra fundamental são as Relectiones theologicae, publicadas depois de sua morte. São lições extraordinárias dadas aos alunos da universidade em circunstâncias solenes, segundo o costume da época e desenvolvem temas de grande interesse. Entre elas, destacam-se as que tratam do poder civil, do direito público eclesiástico e, principalmente, as que tratam das questões colocadas pelo descobrimento e conquista da América.
Outra das obras são seus Comentários à parte moral da Summa theologica de Santo *Tomás. Tais comentários coletam suas lições durante o curso acadêmico.
— Vitória passou à história do pensamento por sua filosofia política e como criador do direito civil ou direito internacional:
1. Para ele, a comunidade política constitui uma instituição de direito natural e é autônoma no sentido dos fins temporais do homem. Todo grupo humano exige uma autoridade que assegura o bem comum.
— O poder reside, derivado originalmente de Deus, imediatamente na comuniddade como tal. O governante que participa da comunidade submete-se não só ao direito divino e natural, mas também ao positivo.
— Quanto ao direito eclesiástico, sustenta que
o papa não tem a plenitude do poder e somente tem sobre o temporal um poder indireto em matérias que afetem o bem espiritual. Diferente do Estado, a Igreja é de direito divino.
Nega ao papa, em conseqüência, a soberania universal. Sua jurisdição estende-se somente aos cristãos.
— Dentro da Igreja, o papa está acima do Concílio.
2. A contribuição mais importante de Vitória para a filosofia política pertence ao campo do direito civil. Sua idéia central é a do orbe — totus orbis — como comunidade universal dos povos fundada no direito natural.
�. Todo povo é convidado a formar e a constituir-se em Estado. Os povos organizados politicamente encontram-se unidos entre si pelo vínculo da natureza humana comum, que dá lugar à pessoa moral do orbe.
�. A sociedade internacional resulta da sociabilidade natural do homem, de alcance universal. Seu vínculo é o ius gentium, que Vitória concebe como um direito universal da humanidade, que dimana da autoridade do orbe.
�. Conseqüência da idéia do orbe é o reconhecimento da personalidade jurídico-internacional das comunidades políticas não-cristãs. Além disso, existe um direito de comunicação entre os povos, ao qual nenhum deles pode subtrair-se sem justa causa.
3. A originalidade de sua doutrina tem sua aplicação no problema da legitimidade da ocupação da América. Vitória desfaz os argumentos apresentados pelos reis e pelos teólogos para ocupar e manter as novas terras. Constrói outra série de argumentos válidos como o ius communications e a incapacidade efetiva dos índios, transformando assim a conquista em tutela e proteção. A difusão do Evangelho justificaria a conquista somente na medida necessária para permitir sua pregação, porque a fé não pode ser imposta pela força.
�. Finalmente, seria lícita uma intervenção, por razões humanitárias, no caso de graves violações.
�. Vitória, portanto, é um pioneiro da filosofia política e do direito civil, que mais tarde reformularão *Suárez, *Belarmino e o próprio *Grócio.
BIBLIOGRAFIA: Obras: Relecciones teológicas. Edição crítica, com códices, notas e introdução por P. Luis G. Alonso Getino. Madrid 1933-1936, 3 vols.; Obras de Francisco de Vitoria. Relecciones teológicas. Edição bilíngüe (BAC); Luis Alonso Getino, El maestro Fray Francisco de Vitoria. Su vida, su doctrina e influencia, 1930; A. Truyol y Sierra, Los principios del Derecho Público en Francisco de Vitoria, 1949.
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