Servet, Miguel (1511-1553)
De Miguel Servet, conhecido em sua época como Servetus ou Serveto, interessa-nos aqui sua vida, sua vasta mas desordenada cultura, sua obra de medicina, geografia, astrologia e teologia.
Nasceu em Vilanova de Sixena (Lérida) e realizou seus estudos em Barcelona, Saragoça e Toulouse. Viajou pela Itália e pela Alemanha, estabelecendo relações com os principais reformadores do continente, entre eles *Melanchton e *Calvino.
Expulso da Alemanha, instalou-se na França, dedicando-se ao estudo da Matemática, da Astrologia e, principalmente, da Medicina. Paris e Lyon foram suas primeiras etapas do exílio, encontrando nelas um ambiente de letrados, sábios e impressores. Isso lhe permitiu publicar Geografia e Ptolomeu. Dedicou-se ainda aos estudos de Medicina, sobretudo em Vienne, onde viveu de 1541 a 1552.
Em Vienne (França) foi detido, na verdade, por Calvino em 1552. Foi processado, mas fugiu do cárcere no terceiro dia do processo. Em sua fuga até Nápoles, passou por Genebra, onde foi reconhecido e detido a 13 de agosto de 1553. Após uma acusação violenta, levada diretamente pelo próprio Calvino, que o acusava de libertinagem, de fraude, de corromper a juventude e, principalmente, de heresia, no dia 26 de outubro de 1553 o Conselho dos Duzentos condenou-se a ser queimado vivo com seus livros. No dia seguinte, o condenado foi conduzido à fogueira de Champel. Não se retratou. Com seus escritos amarrados em suas pernas, morreu pronunciando estas palavras: “Jesus, Filho do Deus eterno, tende piedade de mim”.
Deixando de lado suas pesquisas e instituições como médico — Servet descobriu e descreveu a circulação do sangue nos pulmões — e sua obra astrológica, exposta em Apologetica disceptatio pro astrologia (1538), interessa-nos aqui sua doutrina filosófico-teológica. Esta se expõe, principalmente, em três obras teológicas: Erros sobre a Trindade (1531); Diálogos sobre a Trindade (1532); Christianismi restitutio (1553), a última e a mais importante obra de Servet. Nas duas primeiras, negava que o Filho fosse da mesma natureza do Pai e co-eterno com ele.
�. A Christianismi restitutio ou restauração do cristianismo, sua obra principal, impressa em segredo e sob o anonimato, é uma obra eloqüente e obscura, sem demonstração nem lógica, com piedosas efusões, de invectivas violentas, principalmente contra o papa e a Igreja Romana, de profecias, de textos tomados de múltiplas fontes. Sua filosofia mostra-o como panteísta. Calvino criticou-o que Deus comunica sua deidade a toda a criação, de que é “pedra sobre pedra, e madeira sobre madeira”.
�. Em seus Diálogos de sobremesa, *Lutero tratou Servet como “mouro”. Servet não se considera de nenhuma confissão. Seu cristianismo, irregular e confusamente expresso, seria única e exclusivamente seu. Assim, sua teologia separa-o essencialmente dos católicos, sobretudo com relação ao dogma da Trindade. Segundo ele, Cristo não é Deus por natureza, mas chegou a sê-lo pela graça. É o intermediário entre o criador e a criatura, mas se diferencia dos dois. Para ele, a Trindade nada mais é que uma questão de modalidade: o Pai, o Filho e o Espírito Santo não representam senão três modalidades de manifestação divina.
�. Da mesma forma, Servet opõe-se aos protestantes, apesar de se ater à autoridade da Escritura. Revela-se contra a doutrina da justificação pela fé. Rejeita a rígida predestinação dos calvinistas, que rebaixa o homem à categoria de “pedra” ou “tronco de árvore”.
�. Servet foi repudiado em seu propósito reformador de devolver à fé cristã sua pureza primitiva perdida, segundo ele, desde Constantino. “Afirmo que seus magistrados atuaram com toda justiça, escreve Melanchton a Calvino, condenando à morte um homem culpável de blasfêmia ao término de um processo formal.” Assim se sancionava uma morte e uma repressão terrível empreendida pela Reforma.
BIBLIOGRAFIA: Obras: Christianismi restitutio (reimp. 1965); Dialogi de Trinitate (reimp. 1965); De iustitia regni Christi (reimp. 1965). Tradução recente de Restitutio e biografia de Servet.
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